8.16.2009

Como na Vida.


Quando procurava nos confins da Internet por informações sobre Two Lovers, descobri uma crítica de um senhor americano que dizia que era uma pena que este filme (e os outros de Gray) ficasse tão pouco na memória dos seus espectadores. A verdade é que este senhor não mentiu. Os filmes de James Gray evaporam-se rapidamente da memória (ou então sou eu que já estou a ficar velho), não que isso seja prejudicial em qualquer forma, sendo que é explicável por uma consciência fílmica característica deste realizador, ou seja, a crença que: mais do que a memória imagética, deve permanecer no espectador uma recordação emocional - melhor: Humana.
O que se perde em estilismos barrocos (como os de um outro novo realizador americano: Wes Anderson, que muito me agrada) ganha-se em profundidade emocional.

No Blog Os Novos Pornógrafos, citava-se Eastwood - outro (neo-)classissita - que dizia: Como espectador não gosto que se exiba a realização. James Gray segue esta premissa ao longo da sua obra cinematográfica, filma para que ninguém admire, preza verdadeiramente a história e a trama, nunca se sobrepondo com esbanjamentos criativos ou demonstrações excessivas de vigor estético.

Eu digo que: Two Lovers é o melhor de Gray. Pirmeiro, é aquele em que mais liberdade teve. Segundo, é aquele que não se esconde por de baixo do filme de género (Gangsters, Mafiosos, Policial, em suma Thrillers). Terceiro, é aquele que mais me agrada - encanto-me mais facilmente com história de amor impossível, que com intrigas familiares.

Tal qual como Eastwood (a comparação não é assim tão forçada), há uma profunda sapiência na forma de filmar de Gray, uma paz interior imensa (como escreveu Luís Mendonça do Cinedrio: è um filme dócil). Gray distingue-se pela precocidade, um realizador que até agora só fez quatro longas-metragens tem já um conhecimento do mundo, das relações humanas e da sua complexidade que costuma ser característica de mestres de idade avançada (lembro-me de Resnais, Lumet ou Rohmer), conhecimento originário numa cinefilia profunda e adulta, em que não só se compreende o cinema através da realidade, como se interpreta a dita realidade através do cinema.

Esqueçamos a simplicidade telenovelesca do Amor, ou a noção de destino (It was written) de filmes como Slumdog Millionaire. Two Lovers é eminentemente complexo, compreende que as emoções não são objectos polidos e lineares, mas sim materiais por explorar que se moldam às necessidades do criador, cheios de caracteristicas únicas e indespensáveis à sua verdadeira compreensão. Esqueçamos a vulgaridade dos locais comuns; cada momento de Two Lovers é cheio de uma vida; cada quarto, pátio, sala, café, está impregnado de formas, objectos únicos, privados: espelhos físicos e visíveis da alma das personagens que os habitam.

Há ainda a infantilidade pueril (mesmo imberbe) em Leonard, um amor espelhado entre o desejo (Gwyneth) e a paixão (Vinessa Shaw), uma aplicação anti-cliché da teoria das cores (quentes para cenas mais leves e frias para outras mais emocionais), e tanto mais que não me lembro: porque de um filme de James Gray as sensações ficam e as imagens vão, como na vida.

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