8.25.2010

Copo meio cheio


1. Há quinze anos estreava pelo mundo o primeiro filme feito inteiramente num computador, através da recente (à época) técnica da animação digital, que em parceria com a evolução dos computadores e dos softwares pode chegar à precisão narrativa e emocional de filme como Wall.E. No entanto, quando em 95 Lasseter se aventurou na realização daquela obra marcante, teve a consciência de que as possibilidades que a animação computorizada lhe dava eram reduzidas; não podia pegar nas figuras habituais de um filme de animação e fazê-las digitais, porque não se conseguiam desenhar nem humanos realistas (e ainda hoje há grandes dificuldades, vejam-se as tentativas de Zemeckis), nem animais realistas (o filme seguinte seria a Bug's Life sobre insectos, mas a prova de fogo foi com o Monsters, Inc.), que eram à data as figuras recorrentes das animações Disney. Assim sendo Lasseter, Docter, Stanton e Ranft tiveram a ideia perfeita: se temos computadores que só conseguem criar bonecos simples com pouca articulação, então vamos fazer um filme sobre brinquedos de plástico - Toy Story.
Nolan faz algo semelhante com este seu último filme, tomando consciência das limitações que um filme de acção tem, isto é: por norma são desmiolados, colam um monte de cenas, cada uma com mais explosões que a outra e constroem-se nos efeitos, sendo a narrativa um assessório. No entanto Nolan parece gostar de filmes de acção, então a solução que ele arranjou foi simples (ou não): criar uma narrativa que suporte a colagem de sequência de acção (uma história que justifique os efeitos especiais), sem no entanto tornar o filme estúpido, e a solução foi fazer a história saltar de sonho em sonho, de modo a que possamos passar por um templo oriental para um país do médio oriente indo à neve fazer ski para logo depois ser perseguido numa cidade cosmopolita, ou seja temos um Bond a passear pelo(s) mundo(s) [dos sonhos].
Verdade seja dita, se na primeira parte do filme, se sente que estão todos com pressa e que os cenas se sucedem com um ritmo atípico (dá a sensação que se quis encurtar a duração do filme), temos depois cerca de um hora de por os nervos em franja e para isso vale a pena o filme (as cenas sem gravidade são um primor e a construção em níveis de realidade a velocidades diferentes, dá um ligação forte à dita colagem, meio arbitrária, de cenas de acção).

2. Luís Miguel Oliveira escreveu uma crítica negativa ao filme (e Vasco Câmara ainda veio dizer pior), curioso é que eu concordo com quase tudo, Nolan funciona por ondas, quando Dark Knight saiu estava no IMDB como o 4º melhor filme de sempre, agora Inception é o 3º melhor, quando o seu próximo filme sair, tudo indica que a segunda posição será alcançada. Enfim, irrita-me bastante que as pessoas balam (como as ovelhas) quando aparece um filme de acção que convenhamos, é um pouco melhor que a vizinhança, mas que no entanto sofre de tantos problemas que se torna confrangedor, diz Miguel Oliveira com razão: " 'A Origem' tem que pôr as personagens permanentemente a explicar o que aconteceu na cena anterior e o que vai acontecer na cena a seguir, como se o filme tivesse integrado um PDF com o manual de instruções". Já não concordo é com dizer mal do Blade Runner, esse sim um exemplar maior da ficção científica.

P.S.:Revi recentemente o Collateral de Michael Mann e, esse sim, é a demonstração de um filme de acção tão jovem e inteligente e claro está o Minority Report era (e é) um assombro. Nem todos os filmes de acção têm que ser maus, e fazer um bonzinho não é assim tão raro. [Lembrei-me agora de Hot Fuzz esse também de uma manipulação brilhante dos clichés do género]

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