Quando começo a escrever dou-me conta que as ideias e as frases surgem como a outros. Sinto que os dedos correm no teclado como já correram a tantos, e que na verdade aquilo que escrevo já foi escrito, pensado e mais elaborado. Só muito raramente estou em crer que aquilo que penso e escrevo é verdadeiramente novo e de valor. Escrever sobre Winter's Bone é pois um tormento, primeiro por o filme, sendo bom, não ser uma maravilha, segundo porque aquilo que tenho para dizer não é verdadeiramente importante e a minha acutilância nunca foi aquele que se pede.
Portanto, começo por iniciar este texto com uma introdução vitimizadora e viro-me para a análise com uma pergunta: Como filmar a adolescência sem cair nas vulgaridades do coming of age, isto é, tratar os adolescentes como adultos em potência e que todo o processo de crescimento é simplesmente um meio. A esta pergunta, muitas respostas poderiam surgir, todas eles recusariam a estética da adolescência MTV, mas muitas cairiam num certo paternalismo (como tantas vezes acontece, mesmo que com as melhores das intenções). Debra Granik (não será certamente por acaso que é uma mulher que filma desta forma, mas essa história do género por de trás das câmara leva sempre a discussões vacuosas) encara o problema com total desapego. Aquilo ali, aquela moça, não é uma adolescente, apesar dos 17 anos. Não tem telemóvel e amigas para ir ao cinema, apesar dos 17 anos. Tem uma mãe incapaz e dois irmãos mais novos para educar (e note-se que nunca é a estética do miserabilismo que governa, longe estão Iñarritu e Lee Daniels (Precious)), mas apesar de tudo, tem 17 anos. É simultaneamente a idade que ossifica a personagem e lhe dá volume, mas mais que isso é a forma como 17 anos afectam o retrato, não afectando a narrativa.
Claro que se pode pegar pelo novo cinema rural, onde Kelly Reichardt (Old Joy, Wendy & Lucy e agora Meek's Cutoff ), Lance Hammer (Ballast) e Jeff Nichols (Shotgun Stories) vêm deixando marca, mas na verdade não é isso que interessa. Winter's Bone é muito mais sobre como encarar os jovens sem simplismos, exageros ou paternalismos. É muito mais sobre como encarar a realidade a partir de um sítio (naive) e tomar-mo-nos conta do peso das coisas.
[e só mais um apontamento; aquela cena final em que já estamos a antever os créditos e vemos o nosso homem a pegar numa viola, com ar dengoso, mas a coisa sai para o torto, ele não sabe tocar; e por isso é uma criança que dedilha as cordas e nos embala de novo para o lado de cá - na imagem. Isto para dizer que o filme funciona nestes equívocos: o que se espera vs. aquilo que acaba por acontecer]
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