O dedo é coisa mole. Não dá o rendimento da caneta no papel. O rascunho que se guarda na memória do computador não é um papel que se amachuca e deita fora. A obrigação de escrever é sempre diferente quando o suporte permite outras coisas que não aquela que é essencial: suportar a escrita. Assim sendo, escrever sobre True Grit tem sido um tormento. Vem e vai, a vontade. Começa-se não se acaba. Reescreve-se. Desiste-se. Depois vem uma fúria, uma vontade imparável e sai um texto de uma só vez. Sai directo, porque as palavras se vinham alinhando na parte de dentro, e agora jorram por rebentamento da barragem.
Os Coen têm os dentes doces e neles devem chupar demoradamente. Pensando nos seus projectos, desenvolvendo as suas ideias, demoradamente, classicamente. Encarar uma readaptação é por isso trabalho duplicado: para além de conceberem um filme, têm que o fazer pondo de parte, conscientemente, a primeira versão de Hathaway. A questão está (ironicamente) em perceber, que apesar da independência, várias soluções narrativas e visuais coincidiram; nomeadamente na sequência da travessia do rio, a cavalo, que parece uma reprodução à la Gus Van Sant. Este ponto levanta aliás uma questão que se deve tomar em conta: de que forma é que um trabalho pode ser verdadeiramente original?
Ultrapassando este ponto que de sumarento tem pouco, passemos àquilo que me vem sendo repetido pela memória: uma cena de despedida. O bêbado está bêbado. O jovem é jovem. A moça pespinhenta está apaixonada. Isto mesmo, enquanto o dude dorme a piela, o ranger quebra o trio e despede-se da menina. Sequência magistral; um conjunto de planos-contra-planos que narram a despedida, todos enquadrando as faces no breu com uma corda grossa separando-os. Cada plano apanha a corda. Ela separa-os fisicamente. É o fio social que os afasta. Não é uma árvore ou um penhasco, é algo humano, estendido propositadamente pelos próprios. A auto-negação da felicidade, do amor e do desejo.
Toda esta acumulação tem que subir os bordos e (peço desculpa pelo pleonasmo) transbordar nesse desenlace final, numa caverna pejada de cobras. Uma criatura puríssima rodeada de animais fálicos que a tentam perfurar. Mas ao contrário de Hathaway, quem brinca com o fogo queima-se e existem consequências para quem ousa passar os limites da corda.
Os Coen têm os dentes doces e neles devem chupar demoradamente. Pensando nos seus projectos, desenvolvendo as suas ideias, demoradamente, classicamente. Encarar uma readaptação é por isso trabalho duplicado: para além de conceberem um filme, têm que o fazer pondo de parte, conscientemente, a primeira versão de Hathaway. A questão está (ironicamente) em perceber, que apesar da independência, várias soluções narrativas e visuais coincidiram; nomeadamente na sequência da travessia do rio, a cavalo, que parece uma reprodução à la Gus Van Sant. Este ponto levanta aliás uma questão que se deve tomar em conta: de que forma é que um trabalho pode ser verdadeiramente original?
Ultrapassando este ponto que de sumarento tem pouco, passemos àquilo que me vem sendo repetido pela memória: uma cena de despedida. O bêbado está bêbado. O jovem é jovem. A moça pespinhenta está apaixonada. Isto mesmo, enquanto o dude dorme a piela, o ranger quebra o trio e despede-se da menina. Sequência magistral; um conjunto de planos-contra-planos que narram a despedida, todos enquadrando as faces no breu com uma corda grossa separando-os. Cada plano apanha a corda. Ela separa-os fisicamente. É o fio social que os afasta. Não é uma árvore ou um penhasco, é algo humano, estendido propositadamente pelos próprios. A auto-negação da felicidade, do amor e do desejo.
Toda esta acumulação tem que subir os bordos e (peço desculpa pelo pleonasmo) transbordar nesse desenlace final, numa caverna pejada de cobras. Uma criatura puríssima rodeada de animais fálicos que a tentam perfurar. Mas ao contrário de Hathaway, quem brinca com o fogo queima-se e existem consequências para quem ousa passar os limites da corda.
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