logo a abrir, uma cena brilhante, a incorporação de imagens de arquivo com as filmadas pelo próprio moretti. uma montagem que percebemos ser jornalística, por culminar num daqueles repetitivos monólogos descrevendo coisa nenhuma. aliás, quando o senhor jornalista em alvoroço espera novas 'informações' do porta voz do vaticano, este reponde dizendo que está na hora das equipas noticiosas se ausentarem do edifício, e como se nos tratássemos de débeis mentais o senhor jornalista repete esta informação para a câmara. é disto que é feito o requintado humor de moretti.
depois, claro, a cena da eleição. a humanização das figuras representantes de deus. sim, é esse o grande trunfo do filme: as figuras religiosas ganham, pelos paramentos e rituais, um estatuto de coisa inumana, estatuto esse que é estimado pela própria instituição religiosa; ora, o que se procede, nessa cena das eleições, quando falham as luzes, ou quando agitam as canetas rezando que não sejam eles os escolhidos, ou o grito desesperado de piccoli aquando do seu anúncio, é a humanização dessas figuras, que pela força dos hábitos (os que se vestem e os outros) se foram afastando da sua natureza carnal.
mas não poderia falar deste filme sem referir a forma (BRILHANTE) como moretti encarou a questão da figura papal como personagem de teatro. cena encantadora, o angustiado papa, confessa-se à sua nova psicanalista (que concluirá que tudo se trata de um trauma sofrido ainda antes do ano) ocultando a sua posição eclesiástica e substituindo-a pela de actor. nada inocente. mas note-se, o crescendo desta posição efectua-se aquando da consagração publica do nosso papam, quando este, numa recatada varanda do teatro que exibe a gaivota, é aclamado pelo público como o papa de todos. nada inocente.
no entanto aquilo que mais (me) marca é o facto de no fundo este papa, escolhido pelo próprio deus e continuando a crer nele seja capaz de admitir que o que não pode ser, não pode ser. isso conclui-se na cena final do filme, quando, depois do discurso, toda a audiência que ocupa a praça agitando as suas bandeiras, as baixa em sinal de aceitação e compreensão. ou seja, o que tem que ser tem muita força.
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