7.26.2008

Os génios também se enganam (?)

O que pensa dos cineastas da nouvelle vague?
Gostava muito de ver os filmes deles! Não fui ver a maior parte deles porque tenho medo que me possam inibir. Quando faço um filme, não gosto de fazer referências a outros filmes; gosto de pensar que estou a inventar tudo pela primeira vez. Falo com os Cahiers du Cinema sobre cinema em geral porque lhes estou muito agradecido por gostarem dos meus filmes. Assim que eles me querem submeter a um das suas grandes conversas intelectuais, digo logo que não. Mas tudo isto é ficção. Sou um impostor: chego ao ponto de falas da 'arte do cinema'. Nunca falarei da arte do cinema com os meus amigos: preferia ficar sem cuecas no meio da Times Square.


Que sensação lhe causam os filmes de Antonioni?
Segundo os jovens críticos americanos, uma das grandes descobertas do nosso tempo é o valor do tédio enquanto um tema artístico. Se isso é verdade, então Antonioni merece estar entre os pioneiros desta tendência como pai fundador. Os filmes dele são telas de fundo perfeitas para manequins de alta costura. Talvez não existam telas assim tão perfeitas, nem mesmo na Vogue. No entanto, era com estas que se deviam assemelhar. Deviam contratar Antonioni para as projectar.

E o que pensa de Fellini?
Tem talento, tal como todos os que fazem cinema hoje em dia. O limite dele- que é também a fonte do seu encanto- tem a ver com de ele ser essencialmente muito provinciano. Os filmes dele representam o sonho da grande cidade alimentada por um rapaz de província. A suas sofisticações funcionam porque são criadas por alguém que não sofisticado. No entanto, ele parece muitas vezes ser, perigosamente, um artista superlativo que tem tão pouco a dizer.


E de Ingmar Bergman?
Não partilho nem os seus interesses nem as suas obsessões, É-me mais estranho que um japonês.

E o que pensa dos cineastas americanos contemporâneos?
Stanley Kubrick e Richard Lester são os dois únicos que me fascinam, à excepção dos velhos mestres. Falo de John Ford, John Ford e John Ford. Não considero Alfred Hitchcock um cineasta americano, apesar de ter trabalhado em Hollywood durante todos estes anos. Parece-me terrivelmente inglês na melhor tradição de Edgar Wallace, e nada mais. Há sempre qualquer coisa de anedóticos no seu trabalho, os seus artifícios não passam de artifícios, pouco importa a forma grandiosa como foram concebidos e utilizados. Sinceramente, penso que Hitchcock é um cineasta cujos filmes não irão suscitar o menor interesse daqui a um século. No melhor de Ford, o filme vive e respira um mundo verdadeiro, mesmo se tivesse sido escrito por Mamma Machree. O mundo de Hitchcock é um mundo de espectros.


Extracto de Kenneth Tynan, Les Entretiens de Playboy: Orson Welles, 1967