10.10.2009

We ain't thinking about tomorrow.

Para que se esclareçam as coisas: vi Public Enemies à quase dois meses quando estreou e, até agora, por preguiça e falta de coragem, não escrevi o que quer que seja em relação ao dito, segundo, este é, a meu ver, um dos melhores filmes do ano. Tudo esclarecido, posso começar.

O Filme de Gangsters é um género eminentemente americano (grande descoberta!) e um género que tem vindo a perder importância comercial nas produções mainstream americanas. Filmes deste género recentes? que eu me lembre, só American Gangster.
O que há de tão diferente entre o filme de Ridley Scott e o novo de Michael Mann? o primeiro fez um filme a pensar no passado, recuperando (metodicamente) o cinema maior do género, canibalizando The Godfather e afins; o segundo, fez um filme que viu o passado, compreende o presente e mostra que de facto existem muitas pontes entre a actualidade e os anos 30. Mann faz isto a (pelo menos) dois níveis de linguagem, um directo e objectivo, faz de Depp e da sua personagem uma estrela (televisiva?) com todos os tiques das estrelas, a fugacidade da vida, o máximo aproveitamento da mesma - living on the edge; mas por outro lado, Mann mostra-nos ('imageticamente') a actualidade dos anos 30 pela belíssima fotografia digital.
Ou seja, por um lado persegue-se um realismo seco e áspero de uma fotografia documental, em que se sentem os poros dos actores respirarem, por outro, modela-se um mito americano às necessidades actuais de estrelato. Mann consegue fazer valer a sua visão: "quero um filme mainstream, melodrama de acção, que seja plausível, para que isto aconteça, vou dirigir um filme de época com o realismo de Entre les Murs ou Gomorra".
E no choque das coisas, criam-se algumas das mais maravilhosas cenas de acção e por outro lado uma das paixões mais sentidas do cinema comercial americano.
Claro que há uns sub-plots, com a presença do Manhattan Melodrama, um imediatismo na modelação das personagens (bastam alguns segundos de tela e zás, é como se os conhece-se-mos desde sempre - se calhar é da alta definição) e um rigor técnico de meter medo; mas o que interessa mesmo é isto: um filme que não se alimenta da memória, mas capitaliza-a em cinema moderno, de massas, mas com acutilância, inteligência e espírito crítico - coisa rara nesta americanidade do século XXI.

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